terça-feira, 20 de dezembro de 2016

Berlim, 19 de dezembro de 2016.

pneus assassinos
passaram por cima dos meus filhos
tiraram o amanhã e seus planos
de final de ano
outro final reservado
massacrante, no início de uma noite fria
na terra onde a guerra brotou
um muro que foi derrubado
dessa vez foram meus filhos a cair
sob o aço do caminhão
vi pela televisão
as faixas de isolamento
os pedaços de vidros sujos de vermelho
no dia que ela foi à feira
no dia que ele comprou chocolates
nem sequer foram avisados
se soubessem, esqueceriam formalidades natalinas
diriam o quanto amavam
e perdoariam seus próprios receios
ouso dizer que se abraçariam à espera do impacto
mas agora o silêncio se reproduz
um eco oco,
uma luz de penumbras,
nas gotas de chuva que caem sem falar
sinto o meu rosto e o mundo
as várias estradas e os desertos
geleiras e minérios
meus cabelos da cor do céu negro de Berlim
sinto os mundos e os meus rostos
numa suspensão de movimentos
viver, volver, voar
talvez de cima se explique
o que daqui só faz chorar.