sábado, 6 de junho de 2009

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Da parada, eu senti todo o cansaço físico e mental daquele motorista de ônibus. O pescoço lutava para manter erguida a cabeça curvada, sem força, expondo todo o desgaste pelos olhos, sem olhar. Subi, então, no transporte público. E paguei. Contraste ainda maior foi observar, pelos ouvidos, a rotina do condutor. Guiava a máquina ao longo do dia, tarde e noite, chovendo ou queimando e, no fim do expediente, precisava apanhar outro coletivo, agora como passageiro, para, quarenta minutos depois, retornar à sua casa. Para dormir cinco horas, e acordar. Sem querer, mas lutar. Porque a necessidade é uma prisão. Privam-se os direitos, acentuam-se os deveres e a utópica liberdade resume-se à de consumir, ao livre arbítrio de comprar essa ou aquela mercadoria. E a ousadia escancarada é o que mais me revolta. "Life tastes good", diz um slogan da Coca-Cola. Outra marca de bebida nos manda continuar andando, mas como andar se arrancam-nos os pés ? Como têm a cara-de-pau de afirmar que a vida tem um bom gosto quando a porcentagem de pessoas abaixo do nível de pobreza é alardante e continua a crescer?

Ainda dentro do veículo, minutos depois, uma menininha entrou distribuindo escritos do tipo "Minha mãe está doente, tenho 4 irmãos e preciso de dinheiro para alimentos", tão comuns e, para alguns, irritantes ao ponto de negarem, ao menos, segurá-los. Eu, na idade da garotinha, também usava pequenos pedaços de papel, para inventar estórias, no entanto, ou desenhar algo que minha mente infantil criava inocentemente. Acompanhei o trajeto da pequena pelo ônibus e o sorriso dado de presente aos passageiros que contribuíam com algumas moedas fez meu peito apertar-se de uma forma inesperada. Era de uma alegria, para mim, impossível de existir em qualquer humano que se encontrasse em estado semelhante. E o cuidado em guardar as moedinhas na pochete improvisada me fez refletir sobre quão importante seria, para ela, aqueles pequenos objetos de aço inoxidável que, com frequência, esqueço nos bolsos ou simplesmente me nego a usá-los. Me senti um merda e quis não mais pensar. O caminho da faculdade ao meu apartamento é, quase com certeza, o mais reflexivo do dia. Penso, entre avenidas, semáforos e buzinas, tentando entender os congestionamentos da vida. E percebo, na maioria das vezes, que apesar das diversas vias, tudo converge à um túnel interditado. Às vezes acredito nas obras, nos novos viadutos e pontes, mas basta algum tempo para que eu caia, novamente, em buracos.

Chego em casa, enfim. Tento distrair-me em alguém, em algum filme, em alguma canção. Dá certo, algumas vezes. Outras, não. Quando não, trago-me para cá. E desmorono. Em frases lidas por poucos. Em sentimentos sentidos por muitos. Mas tudo bem. Jajá eu reergo, e o dejá-vù sempre volta.

Um comentário:

Lorena Tabosa disse...

Frases lidas pelos que sentem o mesmo, de forma assim, demasiada.

Just great!