domingo, 28 de março de 2010

dolor.

Amortecer a vida. Ao mergulhar na literatura, interrompo o gatilho eruptivo da relação humana que, como um incansável carrapato, não desgruda e suga-me o resto de força e vitalidade que ainda mantenho sob os ombros. A comunicação é, definitivamente, fundamental ao robustecer terreno, que não condiz, porém, aos berros jornalísticos, cuspidas conjugais e ao sangue esparramado em cada metro cúbico do planeta-granada. Alcancei um estágio particular em que esquivar-me das vozes intermináveis me transmite uma serenidade inigualável. Minha anti-sociabilidade cresce diariamente como uma barba não feita, e a gilete largada no canto da pia poderá ter uma função mais produtiva daqui pra frente. Não, não matarei um ser sequer, apesar dos olhos de isopor. Apenas deixarei na humanidade marcas inconfundíveis cujo pólen difundirei, como um vento independente, entre os operários dos grandes e pequenos feitos. E não o farei por heroísmo ou pretensão parecida, mas pela necessidade que observo em cada alma de obter, ainda aqui, nesta encarnação, uma vacina que abrande os transtornos de um mundo propagandista, estelionatário.

Acaba a tinta.

Não adianta. Incrementar a escrita, chamar atenção por metáforas elogiáveis, nada preencherá o lago vazio que perdura em minha mente. Não escreverei livro algum e, mesmo se o fizesse, para quem escreveria? Quem leria os psicóticos lapsos do meu cérebro, quem, fora eu e meus vultos? Sou a sombra da minha própria sombra. Ao menos ela, minha sombra-corpo, tem um formato definido e rígido. Descobri, ainda há pouco, a beleza de um trovão intenso; todos tendem a se reunir, ficar próximos pelo medo da percussão de ruídos. Há uma hora desprezei a existência humana, agora rezo aos trovões; não cessem. Ninguém ao lado. Alexandra dorme, n’outra cidade. Quão perto, quão distante, as pedras do asfalto - dormem elas também. E é quando tudo fecha os olhos, quando menos ouço pulsações, que mais tremo como as ramificações de um raio. Recife desafoga o peito, mas mantém-se forno. A chuva rascunha um clima ameno. Risca, joga no lixo. Como fiz. O mormaço do quarto apedreja. Caio no caixão de cerâmica, sinto o suor se mover; o chão, o cão, o vão receptor. Fujo à sala. Nossa almofada me sorri. Está fria e apaga de mim as brasas.

Mi mundo es vacío si no tengo su sonrisa.

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